sábado, 2 de fevereiro de 2013

Crítica: Os Miseráveis (Les Misérables) peca em versão cinematográfica com Hathaway e Jackman

Anne Hathaway na cena do musical Les Misérables (Os Miseráveis) em que canta a famosa música I Dreamed a Dream

Fábio Trindade

Com a voz embargada, um sofrimento pulsante, um cenário caótico, sem contar o texto impecável, Anne Hathaway conquistou o meio cinematográfico ao dar vida a Fantine e interpretar a famosa canção I Dreamed a Dream na versão para as telonas do clássico musical Les Misérables, em cartaz há 28 anos em Londres. Tom Hooper (O Discurso do Rei) quis, indiscutivelmente, que seus atores cantassem ao vivo em todas as cenas, sem qualquer tipo de playback, contando apenas com um piano para acompanhar as tomadas. Algo jamais feito no cinema. Essa foi, sem dúvida, a melhor decisão que ele poderia ter tomado para transportar dos palcos para o cinema algo tão marcante e intenso. Por isso, falar em Os Miseráveis, em cartaz desde ontem, é falar no plano-sequência de quase três minutos, todo em close-up, protagonizado por Anne. Pouco importa se ela sabe cantar ou se a afinação é duvidosa. A carga dramática é simplesmente real, como se ela estivesse bem ali, na sua frente, e pudéssemos sentir a dor que aquela mulher está passando. Tanto que o Oscar de melhor atriz coadjuvante é praticamente certo para ela.

Hugh Jackman interpreta Jean Valjean: papel da vida
Mas Os Miseráveis, por mais que só se citem I Dreamed a Dream, está muito além da Fantine de Anne. Aliás, Hugh Jackman, no papel de Jean Valjean, faz praticamente durante todo o filme o que a colega fez, com a mesma intensidade — e com uma voz mais bonita. Ele está certo ao dizer aos quatro ventos que esse é o papel da sua vida. Na história, tendo como cenário a França do século 19, ele vive um ex-prisioneiro que passou 19 anos na cadeia por ter roubado um pedaço de pão e, mesmo assim, continua sendo perseguido pelo implacável policial Javert (o péssimo Russell Crowe, mas falaremos dele adiante). Jackman encarna o personagem com garra, apesar de algumas vezes soar muito jovem para o fardo que o prisioneiro pede.

Samantha Barks é a grande revelação em Les Misérables
E, no meio de tudo isso, surge Samantha Barks como Éponine, uma estreante em cinema, mas PhD em Les Misérables. A atriz/cantora britânica estrelou a produção musical em Londres por quase dois anos e foi selecionada para interpretar o papel no concerto pelo 25<SC210,186> aniversário. Provavelmente por isso, além de ter uma voz que destoa dos demais colegas, é a única no enorme elenco a passar a interpretação e a qualidade vocal existentes no palco e que o personagem exige. Apesar de Anne e Jackman serem ótimos e segurarem as cenas, a estrutura do roteiro torna superficial o percurso individual não só deles, mas de todas as figuras existentes na trama.

Anne Hathaway e Hugh Jackman foram indicados ao Oscar
Tanto que o filme cai vertiginosamente ao entrar no conflito político da época, quando jovens buscam apoio para uma revolução. O contexto mal explicado deixa tudo muito vazio, não conseguindo estabelecer um elo com o espectador. O fato épico se torna banal e desnecessário, parecendo apenas birra de criança.
O ritmo totalmente atropelado contribui para isso. Não há espaço para o silêncio, para um respiro que seja para reflexão, tão necessário para um texto denso e 99% cantado. Ou seja, a história não se sustenta e os números que no musical exalam o que há de melhor na trama de Victor Hugo passam aos supetões.

Helena Bonham Carter: atuação caricata perde sentido
O relacionamento entre Cosette (a apagada Amanda Seyfried) e Marius (vivido pelo talentoso Eddie Redmayne) é o melhor exemplo. Não há como torcer pelos dois, já que a construção do romance é pincelada ao ponto de deixar mais fictício que um conto de fada. E o que acontece com Sacha Baron Cohen e Helena Bonham Carter (como Monsieur e Madame Thénardier) é ainda pior. Eles transformaram o único ponto de escape na sofredora história em algo tão caricato que, ao invés de pilantras aproveitadores divertidos, eles nada mais são que dois palhações de quinta.

Russell Crowe desliza no papel do policial Javert 
E aí temos Russell Crowe. A sensação que se tem durante todo o filme é que ele está constrangido por cantar, como se fosse ele o preso, obrigado a fazer tudo aquilo. Além de parecer que tem um ovo na boca, ele não expressa qualquer tipo de reação, como o ódio existente por Jean Valjean, tão imprescindível para permear a trama.

Como se não bastasse, tudo é muito previsível. Sabe o close-up dito no início do texto? Se prepare, porque eles virão aos montes. Tom Hooper pode ter inovado na forma de cantar, mas na hora de filmar pesou a mão. Depois de Anne brilhar na cena, os números posteriores, e são muitos, seguem exatamente o mesmo estilo superfechado no rosto do ator. Ele não explora cenários, planos ou qualquer coisa que torne a cena única. É igual do começo ao fim. O resultado é simples: quem não assistiu ao musical em “carne e osso” pode até gostar e mesmo ir às lágrimas. Os demais perceberão que a adaptação de um dos melhores musicais de todos os tempos é fraca e, pior, frustrante.



2 comentários:

  1. Finalmente, alguém com bom senso. Essa versão é pífia. A única cena bonita mesmo é a cena da Anne, o resto é arrastado, lento, mas sem um desenvolvimento emocional profundo. Tudo soa óbvio, atropelado e maçante. Mereceu as sete indicações ao oscar, mas a oitava (de melhor filme) foi um grande equivoco.

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  2. antonio luiz da costa24 de março de 2013 às 16:11

    e uma pena..tornou-se arrastado ,cansativo e ..sonolento...e a maioria dos cantores deixam a desejar..

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